Houve um tempo em que, para uma empresa privada alugar um canal de satélite da Embratel, era necessário falar com o presidente da República. Foi o que aconteceu com o campeão mundial de Fórmula 1, Nelson Piquet, ao decidir montar uma empresa baseada em serviços de satélite, a Autotrac, que faz rastreamento de frotas de veículos. Ele marcou uma audiência com o ex-presidente Itamar Franco para quebrar a resistência da burocracia da ex-estatal de tê-lo como cliente. ?Foi muito difícil, mas fui o primeiro a ultrapassar essa barreira?, diz Piquet. Hoje a situação seria completamente diferente. Há uma liquidação em andamento para as empresas interessadas em reduzir seus custos com transmissão.
Nunca esteve tão barato alugar espaço nos 34 satélites autorizados pela Agência Nacional de Telecomunicações a operar no Brasil. Nos últimos dois anos, o valor cobrado por serviços básicos caiu pela metade. A tecnologia tornou-se acessível aos mais variados tipos de negócio. Hoje, por exemplo, com R$ 800 empresas podem acessar a internet via satélite em alta velocidade em locais onde as grandes operadoras de telefonia não oferecem esse tipo de serviço. ?É uma tendência de mercado irreversível e os preços continuarão caindo?, afirma Luiz Otavio Prates, presidente da Associação Brasileira de Telecomunicações por Satélite, que foi criada há um mês e reúne indústrias, empresas de engenharia e operadoras ligadas ao setor.
A atual liquidação é fruto do excesso de oferta e de avanços tecnológicos que seriam inimagináveis anos atrás. No caso brasileiro, a situação melhorou para os compradores em função da quebra de monopólio ocorrida em 1997, quando o governo federal abriu o mercado para concorrentes da Embratel. Atualmente, nomes como PanamSat, Star One, Newskies, Loral e IntelSat disputam cada cliente como se fosse o último. O número de empresas que intermediam serviços de satélite também cresceu. ?Estamos em total expansão?, diz Leonardo Petrelli, presidente da Dtcom. Esse é um mercado que movimenta cerca de US$ 500 milhões por ano.
A Dtcom está conseguindo rentabilizar como poucas a disseminação dessa tecnologia. Fundada há dois anos, cresceu vendendo canais de televisão por satélite para associações, empresas e prefeituras. Além dos canais com programação diversificada, a empresa também tem uma dúzia de canais corporativos, em que a programação é definida pelo cliente (a maior parte deles é ligada ao treinamento de funcionários). Quando começou a funcionar, a Dtcom alugou um transponder, pedaço do satélite que faz a comunicação com a Terra, e saiu em busca de clientes. À medida que o negócio se expandia, os valores cobrados ficavam menores. Hoje a companhia tem 230 clientes. ?Os empresários entenderam que o satélite é um item importante em qualquer infra-estrutura de telecomunicações?, afirma Rubens Glasberg, diretor da Converge, empresa que está organizando um evento sobre aplicações comerciais na área de satélite, na próxima semana, em São Paulo.
A queda do preço também ocorreu em terra firme, nas antenas, servidores e roteadores, que organizam o tráfego de informação. O valor do conjunto básico ? um terminal e uma antena receptora ? caiu de US$ 20 mil para menos de US$ 2 mil em dez anos. ?Os preços são competitivos com qualquer outra tecnologia?, diz Edson De Vito, diretor regional Mercosul da Hughes Telecom Americas, que fabrica equipamentos e vende serviços de transmissão por satélite para 160 mil clientes em todo o mundo.
Diversos fatores contribuíram para completar a promoção no Brasil. As companhias desatrelaram os preços do dólar e montaram tabelas em real. Atualmente, a maior parte delas corrige os valores com o IGPM, o índice de inflação da Fundação Getúlio Vargas. Uma nova tecnologia, a banda KU, apertou ainda mais o custo. No novo padrão, as antenas que antes tinham 1,8 m hoje têm a metade da altura. ?Ficou mais fácil transportar e instalar os aparelhos?, diz De Vito, da Hughes.
Outro fator foi o avanço das pesquisas. Elas provocaram um fenômeno semelhante ao que ocorreu com os cabos de fibra ótica, que, à mesma velocidade, transportam uma quantidade muito superior de dados. Por fim, essas novas tecnologias passaram a utilizar PCs comuns. Foi o golpe final nos preços baixos. ?Nossa missão é desmistificar os satélites, que sempre foram vistos como um serviço caro?, diz Fernando Ceylão, diretor da Globalstar, operadora de telefonia por satélite.
A Globalstar, que até então estava dando ênfase maior para
alcançar fazendeiros endinheirados do interior do País, hoje
foca sua publicidade em feiras de negócios segmentadas para
atrair, entre outras, empresas de pesca, de transporte e de rastreamento de frotas de veículos. ?A carteira de clientes muda a cada ano?, diz Ceylão. A companhia tem 6 mil clientes e espera crescer 15% a 20% este ano. ?A cada ano, empresas cada vez menores terão acesso ao satélite?, diz o executivo. E dessa forma, todos chegarão ao espaço sideral